Como dizer ao seu filho que o avô morreu?

Como dizer ao seu filho que o avô morreu?

Infelizmente vivemos esta situação há uns dias. O meu pai faleceu após doença oncológica prolongada.

Depois da conversa, com o nosso filho mais velho com 4 anos, apercebemo-nos dos erros que fomos cometendo ao longo destes meses.

 

Tentar proteger a criança da situação, ocultando-lhe a verdade é um erro. Sem nunca lhe termos dito directamente, o nosso filho mais velho já se tinha apercebido onde era a doença, que era grave e que algo tinha acontecido ao avô, porque quando acordou quem estava em nossa casa eram os avós maternos.

 

Falar com ele foi muito mais difícil do que as chamadas que tive que fazer para a minha mãe e para o meu irmão. Teve de ser a Cátia a iniciar a conversa, porque pensar que o meu pai nunca mais lhe contaria histórias foi das maiores tristezas que já senti. O meu pai adorava os netos e tinha uma paciência infinita para eles. Andava sempre com o telemóvel a mostrar fotografias a quem as quisesse ver. Na fase mais avançada da doença e já muito debilitado, sorria sempre que se falava deles ou recebia mais uma fotografia ou vídeo.

 

Ouvir a pergunta e responder sempre de forma calma e directa. Não responder ao que não foi perguntado. Segundo o psicólogo Eduardo Sá, a simplicidade é sempre a melhor arma: tem que se explicar a morte em termos que uma criança possa entender, e isso não significa dizer-lhe que a pessoa ‘está no Céu’, porque para eles isso significará, literalmente, que estão nas nuvens.

Para demonstrar isto mesmo, alguém disse ao nosso filho mais velho que o “Avô está no Céu”, e no trajecto para a escola, perguntou-me: “Papá, o Céu fica por cima do Espaço?”. Confesso que fiquei perplexo e orgulhoso em simultâneo. Orgulhoso, porque tínhamos falado sobre o Espaço no fim de semana e confirmei que ele tinha percebido o conceito. Todos os planetas e estrelas estão no Espaço. Perplexo, porque fiquei sem saber muito bem o que responder e porque recorrer a meias-verdades ou a eufemismos geram confusão e quebram a confiança das crianças, segundo  pediatra norte-americano T. B. Brazelton.

 

Frases como “O Avô está a dormir” são mesmo de evitar, porque podem desencadear medo de ir dormir. Eduardo Sá acrescenta que “as crianças pequenas são literais: por isso explique a morte em termos básicos, se um avô morreu, pode dizer que o corpo dele deixou de funcionar e os médicos não conseguiram consertá-lo.” Mas cuidado: é melhor não dizer “o avô morreu porque estava doente”, ou o neto achará que, de cada vez que tiver gripe, estará em risco iminente…"

 

Muitas crianças vivem um luto secreto, que muitas vezes não verbalizam com os pais e apenas partilham com os seus amigos da escola. Ao sentirem os pais tristes, preferem falar sobre a morte de alguém próximo, como o melhor amigo da escola. Este luto pode suscitar perguntas dias, semanas ou mesmo meses depois. Além disso, criança pode estar triste por causa do Avô num momento e a brincar com o Lego no momento seguinte. Estas perguntas, por vezes muito espaçadas no tempo, fazem parte dos mecanismos que a criança utiliza para processar a morte.

Depois de termos falado com o B., deixei de simplesmente de lhe ocultar as lágrimas ou quando estou mais triste. Sei que ele percebe o que estou a sentir e por vezes vem abraçar-me.

André Dinis

Publicado originalmente na Newsletter da Muah de Outubro. Pode subscrevê-la aqui.

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